quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

MEU DESEJO EM XEQUE

Quando minha hora chegar, não tentem introduzir em meu corpo, uma vida artificial, usando uma máquina. Ao invés disso, dê minha vista para o homem que nunca viu um sol nascente, um rosto de bebê ou amor nos olhos de uma mulher. Dê meu coração para uma pessoa de que o próprio coração causou nada mais que, últimos dias de dor.

Dê o meu rim para aquele que depende de uma máquina para existir de semana a semana...

Pegue meu sangue, meus ossos, todos músculos e nervos do meu corpo e ache um meio de fazer uma criança aleijada andar. Explore todos os cantos do meu cérebro. Pegue minhas células, se necessário, e deixe-as reproduzir e algum dia, um garoto que fala pouco estará apto para gritar enquanto seu time marca gol e uma garota surda ouvirá o som da chuva contra sua janela.

Queime o que restar de mim. Espalhe as cinzas para o vento, para as flores crescerem.

Se você quer mesmo enterrar alguma coisa, deixe minha falta, minha fraqueza e todos os meus preconceitos contra meu semelhante. Dê meus pecados para o diabo e minha alma para Deus.

Se você for querer lembrar de mim, faça-o com certa façanha, ou fale com alguém que precise de você.

Se você fizer tudo isso que eu pedi, eu viverei para sempre.


Texto inglês de autor desconhecido.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009


UM POUCO DE CULTURA NORDESTINA
Sair um pouco de temas sérios é sempre bom! Por isso, resolvi compartilhar um texto de expressões populares muito comuns aqui pelo Nordeste.

O humor da língua do povo

O folclorista pernambucano Liedo Maranhão pode se considerar um felizardo: faz parte da restrita tribo dos que se divertem trabalhando. A mais divertida pesquisa feita por Maranhão trata do linguajar nordestino. Paciente, ele coletou centenas de frases criadas pela imaginação popular. Há um traço comum nas frases: a maioria traz comparações pontuadas pela expressão “que só”. Eis um pequeno mostruário das frases que Maranhão colheu na boca do povo:

“Enfeitada que só bicicleta de pobre”
“Tremendo que só pudim”
“Mole que só folha de jornal no sereno”
“Animado que só ajudante de missa”
“Comendo gente que só areia de cemitério”
“Por fora que só quarto de empregada”
“Tremendo que só cotovelo de violinista”
“Liso que só garrafa ensaboada”
“Bom que só dinheiro achado”
“Atrapalhado que só cachorro em procissão”
“Por dentro que só água de coco”
“Sofrido que só pé de retirante”
“Brabo que só guarda-noturno”
“Comprido que só explicação de gago”
“Passeando que só pitomba em boca de velho”

Compilação: Almanaque Fantástico
Edição especial/novembro 2005/Editora Globo.

domingo, 4 de janeiro de 2009

Resumo do livro "A Invenção do Nordeste e Outras Artes", de Durval Muniz de Albuquerque Júnior

“O Nordeste é um recorte regional muito recente para ter qualquer tradição”.

Por quê? Nas 317 páginas de “A invenção do Nordeste e Outras Artes” (Cortez Editora, 1999. São Paulo), livro basilar para compreensão e interpretação da produção artística e cultural realizada ao longo do século XX sobre a região se questiona tantas definições. Por que se aceita e venera com tanta intensidade o Nordeste da seca, dos santos beatos, dos tipos festeiros, do batuque do maracatu e cadência do pífano? Por que o Nordeste aceitou tão facilmente a carapuça regionalista? São muitas as perguntas, muitas as dúvidas e desafios também. No resumo a seguir, o pesquisador discute as muitas feições que o Nordeste tem assumido ao longo dos tempos. A conferir

Estamos diante de um livro denso, rico de idéias, uma abordagem interessante sobre o surgimento da região Nordeste na “Paisagem Imaginária” do País no final da primeira década do século XX em substituição a antiga divisão regional do país entre norte e sul; porém, uma região fundada na “Saudade e na Tradição”.

O pesquisador e historiador Durval Muniz de Albuquerque Júnior, é doutor em História pela Unicamp e titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Seu texto analisa de forma poética (o eu-lirico do autor aflora magistralmente no enredo em alguns momentos) e científica (pelo rigor da analogia e do método utilizado para mostrar-nos a fantasiosa simbologia criada para este espaço) a evolução de uma região do Brasil, situando-a no conjunto dos mecanismos constitutivos de um projeto de bases culturais e sociais diversificadas.
O autor busca compreender o conteúdo e as modalidades da ação dessas bases culturais, as especificidades dos agentes, os princípios norteadores de sua intervenção, analisando as determinações mais amplas da regionalização e diversificação dessa cultura.
O trabalho apresenta-se organizado em três partes.
No primeiro capítulo, o autor reconstrói, a partir do estudo ”Geografia em Ruínas” (P.39), o desenvolvimento histórico que nos possibilitara a compreensão de toda essa montagem do mosaico do espaço Centro Sul e o Antigo Norte.
Inicialmente, é abordado a eminência de um novo regionalismo, onde se busca enfatizar as mudanças significativas ocorridas nestes espaços nos idos do século XX. De um lado o Centro Sul despontando como centro cultural notável e também centro glamoroso e financeiro do país, com transformações substanciais em todos os âmbitos; do outro, o Antigo Norte, por sua vez, vivenciando também essas mudanças; porém, com a sinonímia da pouca expressividade cultural (não que a região fosse desprovida de cultura; pelo contrário, era riquíssima em todos os aspectos, só que, todos os investimentos e atenções estavam voltados para o Centro Sul), da dependência e submissão.
Porém, é plausível destacar também que, pela primeira vez será discutido a questão do espaço; embora se perceba, um olhar diferente e até depreciador, dependendo do espaço. Vale salientar que, essa idéia de discutir a importância do espaço social passa a ter um significado maior a partir da primeira guerra mundial. Ora, a política desencadeada na Europa sempre refletiu em nosso país; diga-se passagem, com muita intensidade. Portanto, a primeira guerra mundial será o anúncio oficial da digladiação dos países europeus economicamente fortalecidos em busca de espaços. Pois, o capital industrial se expandia e precisava urgentemente apropriar-se de espaços para o escoamento dessa produção e conseqüentemente dominá-los. Neste sentido, será inventado o Nordeste que, terá a mesma função destes espaços “conquistados” pelos capitalistas europeus dominantes. Só que tem um detalhe, no nosso caso será em relação ao Centro Sul.
No que tange a questão da importância do espaço Nacional Brasileiro, vejamos o que afirma o autor, quando é analisado o espaço do Norte e do Sul: “seja na imprensa do Sul, seja nos trabalhos intelectuais que adotam os paradigmas naturalistas, seja no próprio discurso da seca, o Norte aparece como uma área inferior do país pelas próprias condições naturais (...)” (P. 69).
Portanto conclui-se o capítulo tocando na questão do fator natural (clima) e o étnico (raça). E além do mais, é dentro dessa vertente que, será moldada a região Nordeste que irá substituir “a antiga divisão regional do país entre Norte e Sul”.
No segundo capítulo, Durval Muniz procede com a analogia da questão regionalista; desta vez dando ênfase ao espaço no aspecto cultural e político. Grosso modo, o espaço em epígrafe será o nordestino que a partir de então, irá romper com essa dualidade Norte/Sul.
Na análise do espaço nordestino, observa-se que, o plano cultural será mais enfatizado do que o político; embora, não descartemos esse último, pois, o texto deixa transparecer que aquele discurso disperso de outrora da classe dominante da região, agora tem outra conotação: prima em mostrar as rupturas e desigualdades existentes em relação ao Centro Sul. No entanto, os flagelos da seca e da miséria fortalecem esse discurso, causando até mesmo impacto no plano nacional.
Quanto à abordagem cultural, ela é mais incisiva; pois, através das análises sociológicas e antropológicas da região frente ao naturalismo, observa-se a preocupação de vários estudiosos em mostrar e explicar as fissuras sociais existentes naquele espaço.
Dentro desse contexto, o autor é brilhante quando afirma que “é o saber sociológico, preocupado com as questões sociais e culturais, que vai assumindo um papel de suma importância na definição de uma identidade para o brasileiro e para o Brasil, bem como na definição de suas regiões e de seus tipos regionais” (P.93).
Nessa prosa gostosa, chegamos aos “Territórios da Revolta” que será o objeto de estudo do terceiro capítulo do trabalho de Muniz.
Nesse capítulo é analisado o conjunto de idéias de Nordeste, gestada por vários escritores e artistas que comungavam e até militava em partidos de esquerda.
Para o autor, o trabalho desses intelectuais define-se como um serviço de reconstrução da região Nordeste.
Como ele mesmo é enfático em dizer: “a imagem e o texto do Nordeste passam a ser elaborados a partir de uma estratégia que visava denunciar a miséria de suas camadas populares, as injustiças sociais a que estavam submetidas e, ao mesmo tempo, resgatar as práticas e discursos de revolta popular ocorridos neste espaço (...) as terríveis imagens do presente servem de ponto de partida para a construção de uma miragem futura (...)” (184).
Desse modo, a nosso ver, o trabalho do professor Durval Muniz, como instrumento de análise e alerta de uma região marginalizada pelos donos do poder, pode ser incluído dentro de uma perspectiva redentora e valorativa da cultura e do espaço nordestino. Como ele mesmo afirma que, “o Nordeste é uma produção imagético-discursivo formada a partir de uma sensibilidade cada vez mais especifica, gestada historicamente, em relação a uma dada área do país. E é tal a consistência desta formulação discursiva e imagética que dificulta, até hoje, a produção de um nova configuração de ‘verdades’ sobre este espaço” (p.49).

Palavras-chave: Nordeste, regionalismo, história social
Até o próximo artigo!