sábado, 9 de julho de 2011

A caverna


A caverna

(...) é o mundo sensível onde vivemos. O fogo que projeta as sombras na parede é um reflexo da luz verdadeira (do bem e das ideias) sobre o mundo sensível. Somos os prisioneiros. As sombras são as coisas sensíveis, que tomamos pelas verdadeiras, e as imagens ou sombras dessas sombras, criadas por artefatos fabricadores de ilusões. Os grilhões são nossos preconceitos, nossa confiança em nossos sentidos, nossas paixões e opiniões. O instrumento que quebra os grilhões e permite a escalada do muro é a dialética. O prisioneiro curioso que escapa é o filósofo. A luz que ele vê é a luz plena do ser, isto é, o bem, que ilumina o mundo inteligível como o Sol ilumina o mundo sensível.

O retorno à caverna para convidar os outros a sair dela é o diálogo filosófico, e as maneiras desajeitadas e insólitas do filósofo são compreensíveis, pois quem contemplou a unidade da verdade já não sabe lidar habilmente com a multiplicidade das opiniões nem mover-se com engenho no interior das aparências e ilusões. Os anos despendidos na criação do instrumento para sair da caverna são o esforço da alma para libertar-se. Conhecer é, pois, um ato de libertação e de iluminação. A paideia filosófica é uma conversão da alma voltando-se do sensível para o inteligível. Essa educação não ensina coisas nem nos dá a visão, mas ensina a ver, orienta o olhar, pois a alma, por sua natureza, possui em si mesma a capacidade para ver.

(M. Chauí, Introdução à história da filosofia. São Paulo:Companhia das Letras, 2002)

Um comentário:

Rita Santana disse...

Adoro o mito da caverna! Marilena trazida por você é um presente, Luiz! Sair da caverna é difícil e dialogar com o mundo que permanece é doloroso, frustrante, mas necessário!
Grata pela visita, ando com outros afazeres e o blog está um pouco amarelado. Beijos!