sábado, 17 de abril de 2010

Em defesa da Língua Portuguesa


Em defesa da língua portuguesa no nosso país

Ainda há um risco, talvez mais forte do que no passado, de a língua de Camões e de Saramago desaparecer ou ficar ainda mais frágil. Está disseminada a idéia do pensamento único e de uma única língua ‘natural’ desta maneira de ver o mundo.

Meio milênio depois da descoberta das Américas e da criação e do desenvolvimento da América portuguesa, é bom refletir sobre o produto cultural mais significativo deste processo: a língua portuguesa. Antes de este artigo ser escrito, a Mangueira – Salve a Mangueira! – já havia, na vanguarda da cultura popular brasileira, lembrado disto, no belíssimo samba-enredo deste ano.
O Império colonial luso foi formado na mesma época acima citada, indo muito mais longe. Incluiu várias regiões da África e da Ásia. No que viria a ser o Brasil, o Império criou sua mais rica colônia sustentada pelo braço dos autóctones e dos africanos convertidos em escravos e imigrados forçados.
Na África, o mesmo Império organizou o tráfico de seres humanos e a produção de subsistência local. Na Ásia, permaneceu no Japão por um século, mordiscou as costas da Índia, do sudeste asiático e da velha China, chegando à Oceania, onde não se estabeleceu, mas se aproximou com algum interesse das costas australianas.
Como conseqüência destes e de outros problemas, a língua portuguesa tem quinhentos ou mais anos de presença nos quatro cantos do mundo. Mesmo que o português não tenha conseguido se consolidar em todos os lugares por onde passou, de algum jeito deixou sua marca que continua a reverberar. Hoje, sobretudo, a partir do seu maior contingente de falantes, isto é, do Brasil.
No tempo da diáspora mundializada, os falantes do português avançaram ainda mais. Eles estão por toda parte através da emigração na direção de onde ainda existe trabalho e salários melhores.
Em alguns casos, esta língua, quando está fora do seu território original, contenta-se em ser uma fala da família e/ou da comunidade da mesma origem. As novas gerações dos filhos dos emigrantes para os países mais ricos estão a perdendo. As versões escritas e faladas do português são fundamentais para manter a comunicação viva desta língua no cérebro de todos os envolvidos.
As descobertas e os processos de colonização jamais foram um caminho de mão única. Os colonizadores sofreram influências dos colonizados. Estes últimos também descobriram novas culturas que chegaram por meio da nova língua de comunicação, imposta pelo poder colonial.
Não se sabe muito sobre os sentimentos dos ameríndios, dos africanos e dos asiáticos sobre a língua do colonizador português. Os vencedores construíram suas versões dos fatos. Pode-se imaginar a surpresa inicial e, no próximo passo, a revolta contra a opressão.
Com o tempo, a língua do colonizador transformou-se na principal língua de comunicação. Todavia, houve sempre a incorporação de palavras, costumes, acentos e outras características dos colonizados. Isto é o que aconteceu de modo muito evidente no Brasil e nas colônias portuguesas na África.
Há várias formas de falar e escrever o português. Todas as tentativas de se tentar criar uma forma única - a que seria justa e correta - não conseguiram sucesso. Não é possível impedir os povos de manejar as suas línguas de acordo com as suas histórias, culturas e interesses.
Não existe a possibilidade de um português perfeito. Isto é uma utopia negativa e desmobilizadora. O mesmo se pode dizer de um francês perfeito etc. As línguas são corpos vivos nas almas das pessoas que as utilizam por toda a vida. Fazem parte dos corpos biológicos dos que as conseguem falá-las, escrevê-las e retê-las em seus registros neurais.
A capacidade da língua portuguesa de se adaptar e de ser falada por culturas muito diferentes é a mesma do inglês e do francês. O português é uma língua de cultura, equivalente às demais línguas modernas. Isto quer dizer que se pode falar de qualquer coisa simples ou complexa, usando-se a língua de Camões.
A vitória desta língua consiste na: força de mais do que 200 milhões de falantes; existência de uma vasta e complexa literatura; presença de redes científicas que trabalham em português; incorporação do léxico e da sintaxe das experiências culturais européias, africanas, americanas e asiáticas; onipresença da música cantada em português e de vários outros artefatos da indústria cultural que fala o português.

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